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segunda-feira, 4 de março de 2013

RAhner & RAtzinger: um diálogo de fé



Este Blog nasceu sob a inspiração da obra teológica de Karl Rahner (1904-1984).


Karl Rahner e Joseph Ratzinger, como é costume dizer-se dos ¨alemães¨, são belos exemplos em que a vida e a obra se confundem.


Se Rahner é considerado um ¨autor difícil¨, até por sua bibliografia gigantesca, Ratzinger foi considerado tímido, de difícil acesso, o ¨Rottweiler de Deus¨, por sua biografia na hierarquia da Igreja, até se tornar Bento XVI. A teologia de ambos carrega a influência de dois grandes místicos da Igreja Católica: santo Inácio de Loyola (1491-1556) e santo Agostinho (354-430).

No dia de hoje, Roma reúne cardeais de toda a Igreja para dar início às solenidades que culminarão com a declaração de que Habemus papam.

O curioso é que os nossos corações se dividem diante da expectativa do novo e se curvam, juntos, diante do desejo do ¨papa emérito¨, aquele que não se consegue mais identificar com o ¨Rottweiler de Deus¨, mas nos conquistou em definitivo com a lição de humildade do peregrino que surpreendeu o planeta, gerando uma tsunami de solidariedade ao seu gesto humano.

Por isso, vivemos a oportunidade inesperada de refletir sobre a Igreja de nosso Senhor Jesus Cristo e, nesse sentido, o gesto de renúncia do Papa é um legado, não do ¨Rottweiler de Deus¨, mas do ocupante da cadeira de ¨Pedro¨, que tão lindamente afirmou sobre a 1 Pe 1, 3-5: 

¨É Pedro que fala! ...  É Pedro que fala à Igreja de todos os tempos¨.



3                Bendito seja Deus, Pai de nosso Senhor Jesus Cristo.
                  Em sua grande misericórdia,
                  pela ressurreição de Jesus Cristo dentre os mortos,
                  ele nos fez nascer de novo, para uma esperança viva,
4                para uma herança incorruptível, que não estraga,
                  que não se mancha nem murcha,
                  e que é reservada para vós nos céus.
5                Graças à fé, e pelo poder de Deus,
                  vós fostes guardados para a salvação
                  que deve manifestar-se nos últimos tempos.


Estamos diante de um gesto que se transforma, dia após dia, em um marco da história humana depois de Cristo. Um gesto que sacode a consciência cristã, que traz o que estava adormecido, sujeito a frivolidades, a um crescente sentimento anticlerical, ou conformista, ou até reformista, mas que foi capaz de despertar a essência da missão cristã, que desafinava tímida diante do mundo secularizado.

Nesse sentido, se ainda é cedo para conclusões, se nos falta o distanciamento necessário à observação dos desdobramentos da renúncia, já é hora de apontar o detonador desta reviravolta: o susto.

Não foi um sustinho qualquer, não é uma notícia qualquer, porque nossa já vida é ¨feita¨ de sustinhos diários, recheados de alegrias ou de tristezas. Foi um solavanco, como o de um avião que despenca num ¨vácuo¨, num susto que nos põe imediatamente alertas, não por mais um noticiário bombástico,  mas pela volta à cena de um tema que sequer era mais ¨assunto¨, mas que repôs na agenda dos cristãos conceitos de conduta pessoal e espiritual que nortearam a liberdade do gesto do ¨servo dos servos¨.

Nesse sentido, a renúncia repercutiu não apenas entre os mais de um bilhão de católicos, mas também alcançou um expressivo percentual da humanidade, adormecido pela indiferença religiosa.

Por isso, o Blog do Rahner, em face da renúncia de Bento XVI, trouxe a opinião de alguns pensadores, com diferentes visões de mundo, e que podem nos ajudar a refletir sobre os acontecimentos. 

Mario de França Miranda SJ e Maria Clara Bingemer, ambos teólogos e professores da PUC-Rio, são reconhecidos pela qualidade de sua produção na academia teológica nacional e internacional, bem assim como pela expertise na teologia de Joseph Ratzinger. 

Mário França é jesuíta e trabalhou por mais de uma década com o cardeal Ratzinger na conceituada Comissão Teológica Internacional, um dos redatores do Documento de Aparecida, além de ser uma referência no que se produz de melhor na teologia acadêmica e pastoral, hoje coordena a Cátedra Joseph Ratzinger (Puc-Rio e Arquidiocese do RJ). 

Maria Clara é incansável autora e batalhadora teológica de renome internacional e acaba de nos presentear com a ¨Apresentação¨ do terceiro e último volume da trilogia de Ratzinger, Jesus de Nazaré. 

Busquei, também, pensadores como Walter Kasper, cardeal que participará do Conclave previsto para este mês, assim como dois jornalistas cariocas leigos: Helena Celestino, de O Globo, e Arnaldo Jabor, poeta, crítico e cineasta.

A divulgação das opiniões de pensadores tão diferentes obedece à identidade da autora do Blog, que  professa, o Credo niceno-constantinopolitano, no que afirmamos crer na Igreja de nosso Senhor Jesus Cristo como unam, sanctam, cathólicam et apostólicam Ecclésiam.

Não se pode admitir uma Igreja una, santa, católica e apostólica que não se apoie na pluralidade. Somos um (em Cristo), mas não somos uni-formes. Somos diferentes e havemos de buscar a nossa própria unidade, a nossa própria santidade e a nossa própria universalidade de peregrinos na escuta, no respeito ao outro, ao diferente de nós, mas com gestos da própria liberdade, seguindo a herança apostólica que, por quase dois milênios, nos leva ao Ressuscitado.

Não se trata de julgar, não se trata de criticar, mas de silenciar e considerar a afirmação forte de Mario França, de que ¨o sagrado também é construído através de uma linguagem e de práticas¨.

Há muito o que aprender com a linguagem e a prática legada a nós por Ratzinger e Rahner que, em suas diferenças teológicas, souberam construir o sagrado por meio de suas biografias que se confundiram com suas bibliografias.

Oremos !



1) No dia 8 de fevereiro de 2013, três dias antes do anúncio de sua renúncia, Bento XVI preside uma celebração com todos os seminaristas de Roma, em que ele medita sobre a Primeira Carta de São Pedro (1, 3-5):

Jussara Linhares

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