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segunda-feira, 5 de março de 2012

Muita gente admite ser criatura. Isto implica reconhecer um Criador. Mas e a criaturidade, tem importância para as nossas vidas ? Vamos à lição de Karl Rahner sobre a experiência da criaturidade ...


Para Rahner, critaturidade significa o processo em que nascemos criaturas e levamos a vida inteira exercitando a nossa liberdade criada (já falamos na nossa liberdade que é criada,  condicionada pelas necessidades de nossa condição humana - sinto fome, frio, necessito de carinho, conhecimento etc. - e situada pelas circunstâncias de nossa vida, já que posso ter nascido na Idade Média, ou na Antiguidade, posso ser solteiro, rico, escravo, etc...). 

Assim, a criaturidade é o processo em que, 
por meio do acolhimento da Graça de Deus, 
que nos é por Ele ofertada, fazemos as escolhas que 
apontam com um sim a Deus (num sim ao irmão). 

Esse somatório de experiências do sim (entre inevitáveis nãos...) é a nossa vida, é o que faz com que ao morrermos, não morreremos do jeito que nascemos. Espera-se que o cristão chegue ao fim de sua caminhada na história melhor do que quando nasceu. 

Se a criaturidade é a única chance que temos de 
atravessar o tempo e a história e 
chegarmos melhores diante de Deus, 
daí podemos entender o porquê de Rahner dizer 
que o cristão deve levar a vida com muita seriedade.

Eu mencionei que a criaturidade, ou seja, este processo de escolhas que vai traçando a vida cristã, conta com o oferecimento da Graça de Deus. 

Quando falo na Graça, eu quero dizer da ¨Graça de Deus¨, da gratuidade de Deus conosco, sob qualquer denominação que possamos dar a ela. 

Isto porque a nomeação da graça é sempre secundária. Primeiro vem a experiência que fazemos desse infinito 
e misericordioso amor de Deus. 

Rahner fala num ¨amor indulgente¨. Se você olhar no dicionário vai ver que indulgente é o que está sempre pronto para perdoar. Olha que coisa mais linda, mais cheia de Graça, é Ele que já veio e não passa num doce amor infinitamente indulgente.

Se falei em Graça sob qualquer denominação é porque o próprio Rahner, que ficou conhecido como teólogo da Graça, vai avançando em seu trabalho e passa a nomear a graça como Experiência do Espírito Santo e como a autocomunicação de Deus, que é Deus em si, se doando ao homem.  

E aí entra aquela expressão tão bonita e mal compreendida, do cristão anônimo, aquele que não sabe, mas que também é ¨agraciado¨. 

Sobre este tema, Rahner aconselha muito cuidado aos cristãos no diálogo inter-religioso, porque o que nós sabemos e nomeamos como ¨natureza e graça¨ e percebemos que neste binômio há uma ¨unidade¨, o não-cristão pode experimentar em sua vida, embora com outra nomeação e, assim, o diálogo se perderá por questões semânticas. 

A unidade entre natureza e graça exige - com Cristo, por Cristo e em Cristo-, que não se possa mais descaracterizá-la. 

Por isso é exigido do cristão diante do mundo uma “sobriedade realista em face do próprio mundo, tal como fundamentalmente somente o cristão pode ter, quer por ter conhecimento explícito de seu cristianismo, quer seja apenas um cristão anônimo, ou seja, um homem justificado pela graça de Deus”.

              A Redenção do mundo criado 74.

Dito de um jeito bonito e orante, ao estilo de uma oblação:
Mas este amor que aceita a vida quotidiana tal como se apresenta, que transforme, entretanto, cada um dos meus dias humanos num dia de graça, para fazer chegar a Vós este amor, somente a Vós que dele me poderei fazer dom.  
Que poderei eu dizer-Vos nesta hora em que tento aparecer diante de Vós na companhia dos meus cuidados quotidianos ?  
Só tenho uma oração a balbuciar; concedei-me o dom mais banal e mais maravilhoso que possa existir: tocai o meu coração com a Vossa graça; concedei-me o Vosso amor.  
Permiti que servindo-me das coisas deste mundo na alegria e na dor, chegue, através delas, a compreender-Vos, a amar-Vos, a Vós, o último e único fundamento de toda a criatura.  
Vós que sois amor, fazei-me participar do Vosso amor, para que um dia todos os meus dias cheguem ao único dia da Vossa vida eterna.

Apelos ao Deus do silêncio, 74-75. Inspiração clara no PF (EE 23).

O post de hoje é dedicado aos colegas pesquisadores da FAJE, que me inspiraram num trabalho a ser apresentado pela dra. Eileen FitzGerald, ainda este mês, sobre o grande teólogo jesuíta, o Cardeal Ladária, que menciona KRahner em suas obras sobre antropologia de modo muito fiel. 
O Grupo estuda as interfaces entre a Cristologia e a Antropologia e é coordenado pelo prof. Geraldo De Mori.  Saudades, gente ...

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